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Os ensinamentos que Kiki nos entrega

  • Foto do escritor: Bianca Melo
    Bianca Melo
  • 14 de fev. de 2022
  • 4 min de leitura

Atualizado: 28 de fev. de 2022

Muito mais que uma simples animação divertida, Ghibli nos mostra através de O serviço de entregas da Kiki, uma verdadeira lição de amadurecimento


painting brushes

A jovem bruxinha Kiki protagoniza o filme de animação dos studios ghibli: O serviço de entregas da Kiki, de 1989. Nele, somos apresentados à realidade de uma garotinha que precisa sair de casa e deixar sua família para trás, seguindo os costumes bruxos de que, ao completar treze anos, as jovens bruxas devem iniciar seu treinamento em um lugar longe de seu lar. O objetivo é que aprendam a assumir as responsabilidades que todos esperam que uma bruxa tenha – como dizia o homem-aranha, com grandes poderes vem grandes responsabilidades (aquele blá blá blá de sempre).


Logo no início, vemos Kiki empolgada para conhecer tudo que a aguarda quando partir para o seu treinamento. Ela passa a imagem de uma garota sonhadora e muito otimista. Para ela, tudo são flores e todas as expectativas que ela cria são ótimas – será que já dá para adivinhar que ela caiu do cavalo? Ou melhor, da vassoura? Porque sim, é isso que acontece, literal e figurativamente.


Ela resolve levar apenas a vassoura mágica que sua mãe lhe deu, um rádio onde pode escutar sobre a previsão do tempo, e seu gato preto, Jiji (extremamente fofo e mil vezes mais racional que sua dona, afinal, assim são os gatos). Sua aventura mal se inicia, e muitas coisas começam a dar errado. Mesmo assim, Kiki não perde as esperanças. Depois de uma noite complicada, ela finalmente chega à cidade onde deve realizar seu treinamento. Porém, o lugar é muito diferente daquele em que ela cresceu – muito maior e mais populoso. Além disso, as pessoas não são lá muito educadas. Kiki esperava uma recepção mais acolhedora, mas tudo que ela recebe são olhares esquisitos. Seu look escolhido com carinho – vestido preto e laço vermelho na cabeça, o único look que ela tem – é visto com estranheza e ela de repente se sente deslocada.


Depois de passar por poucas e boas, Kiki finalmente encontra acolhimento numa padaria, onde os proprietários decidem contratá-la em troca de alimento e um quarto no sótão onde ela e Jiji se abrigam. Porém, seu treinamento como bruxa não pode ser deixado de lado, e logo Kiki encontra uma forma de fazer seus poderes se tornarem úteis para as pessoas daquela região. É aí que surge o serviço de entregas da Kiki. A bruxinha e seu gato fazem uma espécie de serviço de correios (só que muito mais eficiente). Eles sobrevoam a cidade na vassoura mágica entregando encomendas para as pessoas que precisam. É assim que Kiki começa a garantir seu sustento ao mesmo tempo em que desenvolve seus poderes e ajuda os cidadãos daquele lugar (que já não parecem tão mal-humorados assim).


Ao longo de suas jornadas de entregas, Kiki passa por muitas aventuras e corre grandes riscos. Ela tem a oportunidade de conhecer pessoas bondosas, que a tratam com carinho e respeito. Mas também conhece pessoas nada amigáveis, que acabam por deixar a bruxinha para baixo. É de cortar o coração as cenas em que essa menina é decepcionada. Enfim, é aquela coisa que eu sempre costumo pensar: não crie expectativas altas demais para não sofrer quando elas não forem atendidas. Eu sei que parece meio mórbido e passa a sensação de falta de fé nas próprias conquistas. E Kiki me mostrou que é isso mesmo, que pensar assim é coisa de gente otária que não está disposta a viver grandes aventuras com medo de cair da vassoura e se ralar. É que às vezes é bom cair da vassoura e se ralar, sabe? Todas as decepções que Kiki sofreu ao longo do tempo, desde que saiu de sua zona de conforto na cidadezinha pacata na qual passou sua infância, serviram para que ela crescesse e amadurecesse. É meio clichê, mas não poderia ser mais real.


O fato de ela ser diferente atrai uma atenção indesejada assim que chega à cidade. Isso retrata nossa sociedade de forma geral, que julga e despreza tudo aquilo que é diferente do padrão – desde as roupas até o comportamento, estilo de vida e grupos sociais. O mais interessante é que mesmo sendo otimista com relação a tudo, chega um momento em que ela se cansa de tanto dar de cara com a triste realidade de que nem tudo são flores e há pessoas simplesmente cruéis no mundo (algo que não deveríamos encarar com tanta normalidade, inclusive).

Jiji, eu acho que há algo errado comigo. Eu faço amigos e depois não quero mais ficar com eles. Parece que aquela eu, alegre e honesta, foi embora”

A transição de autoconhecimento e reconhecimento do mundo à volta de si é a coisa mais bonita de observar no filme. Kiki conquista sua independência e tem que arcar com as responsabilidades difíceis. Há momentos em que ela só quer desistir. Mas Kiki é uma daquelas personagens que, por mais que passem por evoluções, nunca deixam de lado a essência que as acompanha desde o começo. Ela se baseia na bondade e na gentileza, que fazem parte de sua personalidade, para realizar qualquer ação. É por isso que seu serviço de entregas dá certo para ela e para os moradores da cidade – porque ela faz tudo com muito carinho e empenho. Pode parecer trouxice quando a observamos se submeter a certas situações, mas ao mesmo tempo, a sensação de gratidão ao vermos Kiki cumprindo cada uma de suas funções com todo amor faz tudo valer a pena.


Não parei de torcer por ela nem por um segundo e rezei muito para que ela não se perdesse em ideias negativas. Acho que se conseguimos sentir essa empatia pela história da Kiki, também somos capazes de sentir empatia pelas nossas próprias histórias. Se a Kiki, que é toda animada e positiva, ainda se vê desanimada e triste em vários momentos, quem somos nós, meros mortais não-bruxos (menos eu, porque eu sou bruxona), para não nos sentirmos assim de vez em quando? Querer largar tudo faz parte do processo de crescimento – e às vezes conhecer nossos limites e largar tudo também pode ser a resposta. A questão que esse filme nos traz é a determinação em seguir em frente com aquilo que acreditamos ser verdadeiro, seja abraçando algo novo ou insistindo em lutas antigas. Sei lá, só pega sua vassoura e voa, cara, voa.



 
 
 

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